Na contraluz, o meu semblante distorcido...
Pedaço de carne sob a poeira de um monólogo surdo!
Na plateia, um corpo vestido de horizonte
e um silêncio marítimo amordaçando lágrimas...
No camarim, uma estrela apagada;
na porta sem nome, abandonada pelo neon!
Minha sombra errante me faceou no espelho.
Quem contracenará comigo?
Ingressos vencidos, palcos encerados;
cessam os aplausos e adormecem as orquestras.
No cinzeiro, o resto do espetáculo:
minh'alma em cinzas sonhando amanhãs...
Sempre me viram como Sol,
mas, no fundo, sempre fui Lua...
No dourado da estrela solitária,
o desespero de um homem
clamando por socorro!
No âmbar da cortina sem janela,
a voz de um menino
pranteando nas esquinas!
[Ninguém me ouviu...]
É hora de partir:
deixar a bola de fogo
arder e morrer no poente,
e afogar na noite escura
o camafeu que perdeu a luz...
A cabeça, eu a vi derramada na bandeja de prata!
O colar era de sangue,
e a memória, um pavio queimado...
Os olhos foram mortos pela profecia:
palavras de sal,
tempero real para uma oferta de sacrifício!
No espelho da bandeja prateada,
contemplei a imagem duma cruz de carne e osso;
revelações de um tempo que não vivi...